NOTA SOBRE ALERTA DE CICLONE BOMBA NO SUL DO RS, EM JANEIRO DE 2020
Por Omar Jadalla, 01 de Feb de 2021 às 15:35
Nos dias 26 e 27 de janeiro de 2020, houve ampla divulgação na mídia e em redes sociais da previsão de um CICLONE BOMBA no sul do RS. Reportava-se inclusive a hora exata para a sua ocorrência. Entretanto, tal alerta, além de desproporcional e irresponsável, mostra extrema deficiência na análise técnica do fenômeno. Também demonstra a carência de profissionais qualificados para a execução desta tarefa de grande responsabilidade social, que é a Previsão de Tempo e Clima, especialmente de eventos meteorológicos extremos.
O estado do RS vem experimentando, ao longo dos anos, o impacto de eventos meteorológicos importantes. Um destaque óbvio é o Furacão Catarina, único até hoje registrado no Oceano Atlântico Sul, que atingiu o litoral norte do estado em março de 2004. A unicidade do evento provocou discussões na literatura, de pesquisadores e na mídia, inclusive quanto à nomenclatura final do fenômeno.
Muito recentemente, no final de junho de 2020, foi registrada a passagem de um ciclone extratropical sobre o estado do RS, que teve uma intensificação muito forte e rápida. Ciclones extratropicais são eventos meteorológicos comuns na região sul do Brasil e ocorrem em todas as épocas do ano, sendo que no inverno eles têm suas maiores intensidades registradas. Um ciclone extratropical como o de junho de 2020 foi classificado como ciclone bomba. Isso se deveu a sua rápida intensificação; um ciclone extratropical que apresenta uma queda de pressão central superior ou igual a 24 hPa em 24h é classificado dessa forma.
Esses ciclones bomba são raros, em comparação com a frequência de ciclones extratropicais, considerados normais. Além disso, são mais observados em regiões costeiras e no inverno, quando se tem um grande contraste de temperatura entre continente e oceano, o que facilita o desenvolvimento rápido desses sistemas meteorológicos.
A previsão do tempo, uma das tarefas mais conhecidas dos Meteorologistas, tem papel fundamental na tarefa de prevenção e mitigação dos efeitos de fenômenos meteorológicos, em especial, daqueles que ameaçam a vida e a propriedade. Nas últimas décadas, ela tem tido uma ascensão em qualidade, devido a diversos fatores como: pesquisa aplicada, disponibilidade de dados, evolução computacional, apenas para citar alguns. Hoje em dia, os modelos matemáticos (os chamados modelos numéricos) de previsão de tempo configuram-se como umas das principais ferramentas (mas não a única!) ao Meteorologista, na sua árdua tarefa de prever o tempo.
Os modelos matemáticos de previsão de tempo, à despeito da sua grande evolução não substituem os Meteorologistas. Esses modelos possuem imperfeições que devem ser estudadas, entendidas e ponderadas pelos Meteorologistas ao usar seus resultados. Além disso, o período do verão é um período conhecido como aquele de maior dificuldade para a representação da dinâmica da atmosfera, dada as peculiaridades dos fenômenos meteorológicos desse período mais quente.
Fica, portanto, evidente o importante papel do Meteorologista profissional e qualificado no monitoramento, previsão e alerta de fenômenos meteorológicos que possam trazer prejuízos à vida e à propriedade. O estado do RS sobressai-se frente aos demais, pois é um dos maiores polos formadores de Meteorologistas do país, profissionais capacitados e habilitados para o exercício da previsão de tempo. O Curso de Meteorologia da UFPel vem formando Meteorologistas há mais de 40 anos, que atuam nos mais variados setores nacionais e internacionais.
O fato provocador desta nota deve ser visto, também, como uma grande oportunidade para que a população do estado do RS, junto aos setores ligados à proteção da vida e da propriedade, bem como os entes públicos, exija e batalhe pelo estabelecimento de um sistema de previsão de tempo e clima para o estado do RS, a exemplo do que fez o estado de Santa Catarina, contando com Meteorologistas qualificados e habilitados para o exercício da previsão do tempo e do clima.
Por fim, não poder-se-ia deixar de recomendar a busca por informações e alertas de previsão de tempo e clima qualificadas e emitidas por instituições, entidades e empresas qualificadas para este imprescindível serviço à população.
Mateus da Silva Teixeira
Coordenador do Curso de Meteorologia
Faculdade de Meteorologia
Universidade Federal de Pelotas